Mulheres na política, contra as mulheres
Mary Neide Damico Figueiro - Folha de Londrina - 07/06/2022

A maioria das deputadas e senadoras são contra a legalização do aborto, noticiou o jornal O Globo, em 22 de maio. Em uma pesquisa feita pelo jornal, das 89 mulheres atualmente com cadeira no Congresso, 63 responderam ao questionamento. Assumiram a posição contrária à legalização 46, o que equivale a 73% das mulheres ouvidas. Apenas 13 delas (20%) foram favoráveis e 4 se abstiveram. Diante desse quadro, conclui-se que ter mulheres na política não garante que estas lutarão pela saúde da mulher, pelo seu direito “à vida, liberdade e segurança pessoal” e “à autonomia e integridade corporal”, entre outros Direitos Sexuais, os quais são considerados Direitos Humanos. A meu ver, a grande maioria das que se posicionaram contrárias, irresponsavelmente, desconhecem esses Direitos, assim como os Direitos Reprodutivos, e penso que o medo de prejudicar sua possível recandidatura tenha interferido, também.

Se deixar de ser considerado crime, o aborto sairá do campo jurídico e passará para o da Saúde, o que trará avanços. É importante registrar que grande parte das pessoas que militam por essa causa, assim como eu, não são a favor do aborto, mas a favor de sua descriminalização, para que nenhuma mulher seja presa ou sofra reprimendas físicas e morais por ter interrompido a gravidez. Somos a favor da Educação Sexual para que, cada vez mais, garotos e garotas, homens e mulheres assumam a responsabilidade na prevenção da gravidez. Contudo, quando acontecem gravidezes não planejadas ou não desejadas, no desespero, muitas mulheres vão em busca de alternativas para interromper a gestação. As de baixa condição financeira são as que correm maior risco devido aos abortos clandestinos e inseguros, por isso o aborto é uma questão de saúde pública. O Estado tem obrigação de zelar pela saúde da mulher conforme consta na Constituição de 1988, mas, ao criminalizar o aborto, ele compromete a saúde e a vida desta. Desde a década de 1990, o Brasil assumiu o compromisso, em Conferências Internacionais, de rever sua lei do aborto. Quando, no Uruguai, em outubro de 2012, o aborto foi aprovado, o presidente José Mujica afirmou: “É mais inteligente não proibir”.

Em vários países, o tema aborto sempre vem à tona em época de eleição, e é nesses momentos que as vozes pró-vida, ou seja, que defendem o feto, encontram mais vazão. Entre os muitos argumentos usados, este é um deles: Há vários métodos contraceptivos, por que não usou?   Primeiro, como já disse, a reponsabilidade pela prevenção é tanto do homem quanto da mulher; segundo: todos os métodos contraceptivos falham, como apontam a Organização Mundial de Saúde, a Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia e o Ministério da Saúde.

A grande maioria da população é desconhecedora dos efeitos perversos do aborto clandestino sobre a saúde da mulher, com possíveis complicações infecciosas, sequelas crônicas ou morte. No Brasil, a lei que regulamenta o aborto é de 1940 e tem apenas dois permissivos: em caso de estupro e de risco de vida para a mulher. Em 2012, foi aprovado em caso de anencefalia. Mesmo quando está dentro da lei, as mulheres têm enorme dificuldade parar interromper a gravidez com segurança e respeito, nos poucos hospitais públicos autorizados a fazer o procedimento.  Se consultarmos o mapa do aborto, no google, veremos que os países que aprovam o aborto são os mais desenvolvidos social, econômica e culturalmente, e estudos, em países como esses, mostram que o número de abortos diminuiu significativamente.

O Conselho Federal de Medicina e os 27 Conselhos Regionais já se posicionaram a favor do aborto por vontade da gestante, até a 12ª semana de gestação. A luta precisa ser abraçada por deputadas e deputados, senadoras e senadores. Para uma pessoa com cadeira no Congresso ficar do lado da mulher, isto é, assumir a posição pró-escolha, precisa ser corajosa. Meu respeito às pessoas que o são.

 

 

Imagem: Google


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