Discurso ou Educação?
Folha de Londrina, Sexo e Comportamento - 12/05/2010

Após a proibição das “pulseirinhas do sexo”, em Londrina, estive dialogando com pedagogos e pedagogas das Escolas Municipais, por meio de uma palestra, a pedido da própria Secretaria de Educação. Para me preparar para este encontro, enviei-lhes, previamente, a questão: Durante a polêmica das "pulseiras do sexo", e após passada a fase de maior impacto, quais dúvidas ou preocupações você, como pedagoga/o, tem tido? Por e-mail, uma das pedagogas contribuiu com a seguinte ideia: “A nossa maior preocupação é o que fazer com a resistência, por parte de algumas crianças, em não acreditar nos perigos que correm, pois têm necessidade de desafiar”. A seguir, acrescentou duas outras preocupações: a falta de autoridade dos pais junto aos filhos e a grande permissividade que estamos vivendo, onde tudo pode. Por último, desabafou: “temos sofrido demasiadamente e ficamos frustrados perante a sociedade, onde o professor é tratado com desprezo e sem crédito”.

Todos os apontamentos feitos pela pedagoga procedem e devem ser levados a sério, e providências devem ser tomadas no que diz respeito à formação continuada dos professores, no tocante à temática da educação sexual. Além de condições para estudar sobre este assunto, eles necessitam de assessoria contínua. No período em que Paulo Freire foi Secretário de Educação da cidade de São Paulo, de 1989 a 1992, promoveu cursos sobre o tema para os professores, cujos participantes recebiam remuneração pelo tempo de estudo (antes e no desenrolar do projeto), mas deu-lhes, também, apoio incondicional e assessoria contínua. Para a formação de educadores sexuais não basta um curso pontual; é preciso que se dê condições para que continuem refletindo, estudando e discutindo suas dificuldades. O tema sexualidade não é simples de ser trabalhado, pois requer, sobretudo, que o educador reveja seus preconceitos, tabus e mitos, para que, assim, possa abordar com naturalidade o assunto.

A respeito da fala da pedagoga de que as crianças podem apresentar resistência e não acreditar nos adultos, não vislumbrando os perigos que correm, temos que pensar o seguinte: quando um fato como o das pulseirinhas acontece e mostra seus efeitos drásticos, é importante aproveitá-lo (como muitas escolas o fizeram) para dar oportunidade aos alunos de refletir sobre o ocorrido. Se o professor usa a alternativa de fazer discursos sobre os perigos envolvidos no uso das pulseiras, se ele fala de um pedestal, como alguém a quem os alunos devem ouvir e seguir seus conselhos, a chance de eles reagirem com resistência, recusando-se a aceitar as suas ideias, é grande. Contudo, se o professor cria oportunidades para reflexão, para debates em pequenos grupos e com a classe toda, onde ele é o mediador das discussões, os alunos conseguirão perceber o quanto toda a questão das pulseirinhas é repressora e danosa, pois os coloca em situação de vulnerabilidade. Não dá mais para esperar aparecer outro jogo manipulador para se falar, de novo, sobre o assunto. Outro dia, numa conversa informal, um diretor de escola pública disse-me que achava que o caso das pulseirinhas deveria ser ignorado, pois que quanto mais se fala, acaba-se dando muito valor ao fato e pior fica. Omissão, jamais! Na escola, nem calar, nem discursar. Antes: refletir e educar. É preciso começar desde a Educação Infantil, levando-se crianças, pré-adolescentes e adolescentes a pensar sobre o corpo, a sexualidade, o namoro, as relações interpessoais, o respeito a si próprio e ao outro e sobre as variadas formas de repressão, inclusive aquelas que se escondem sob a forma de “modismos” e de “modernidades”.

Os pais também precisam envolver-se como co-responsáveis no processo de educação sexual. E não nos esqueçamos: ao lado de tudo isto, é imperioso que se lute por melhores condições de trabalho, pela formação continuada e também por uma remuneração mais digna, que eleve a auto-estima dos professores e possibilite que estes sejam mais respeitados como profissionais.


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