Educação Sexual: instrumento para a formação integral da pessoa
Dra. Mary Neide Damico Figueiró, Dra. Luana Pagano Peres Molina e Dr Welson Barbosa Santos / Folha de S.Paulo

 A educação sexual no Brasil teve início em algumas escolas na primeira metade do séc. XX, sendo impulsionada a partir de 1980, com o aparecimento do HIV/AIDS.  Após esse período intensificaram-se publicações acadêmicas, como artigos, teses e dissertações, para dar fundamentação cientifica para este trabalho. A formação continuada dos professores nesta área vem sendo ampliada desde de 1990. A aceitação de que a educação sexual é papel da escola, tanto quanto da família, cresceu num nível satisfatório. Contudo, a partir de 2012, aproximadamente, com as discussões para a aprovação do Plano Nacional da Educação (2014-2024), a educação sexual passou a ser veementemente atacada e confundida com um trabalho de instigação ao sexo irresponsável e precoce.

A educação sexual emancipatória e intencional nas escolas pretende ensinar crianças, adolescentes e jovens a pensar e debater sobre tudo o que é relacionado à sexualidade e à sua vivência com responsabilidade. Para isso, o papel do professor não se restringe às informações biológicas; seu papel é oportunizar que os educandos possam sanar dúvidas, expressar sentimentos e rever tabus e preconceitos, para construir uma visão positiva da sexualidade, de modo a vivencia-la sem culpa ou vergonha.  Ao professor não cabe passar seus valores morais, mas oportunizar que o educando construa seus posicionamentos pessoais, a partir, inclusive, do que recebe de sua família. Assim, o propósito maior é desenvolver a autonomia moral e intelectual do educando, num paralelo com a formação dos valores morais importantes: respeito a si e ao outro, justiça, fraternidade, amor e igualdade.

Em nenhum momento a educação sexual visa a estimular o sexo precoce, quantitativo e/ou promíscuo, mas sim, fomentar a afetividade e a capacidade para o diálogo, ajudando o educando a ser sujeito da sua sexualidade, decidindo e escolhendo por si próprio, embasado em conhecimentos, reflexões e debates. Consideramos falha qualquer imposição ao adolescente, seja para abstinência, seja para fazer sexo (“faça; se não fizer, você é careta!”).

O governo federal tem planos de implantar um programa de abstinência sexual, visando diminuir os índices de gravidez na adolescência. Este não será um caminho frutífero, pois comprometerá todo um conjunto de conhecimentos que o adolescente precisa para viver a sexualidade com segurança e responsabilidade. Esse programa desacredita na capacidade do adolescente como um ser pensante e institui o professor como autoridade que dita o certo e o errado e impõe um estilo de vida.

Ideias distorcidas sobre a educação sexual deixam mães, pais e responsáveis confusos e assustados. Contudo, podemos assegurar que um trabalho intencional, feito por professores preparados, só vem a somar com a família. É o ensino da sexualidade, desde a infância, que pode ajudar na prevenção da gravidez na adolescência, na prevenção de ISTs (Infecções Sexualmente Transmissíveis), na prevenção contra o abuso sexual, bullying e toda forma de violência. Ele pode também impactar na formação humana da criança e do adolescente a ponto de não se tornarem agentes do bullying, pois os ajudará a compreender a diversidade humana e a respeitar as pessoas.

Fomentar a abstinência e a retardação do início da vida sexual, certamente, conduzirá ao aumento no número de casamentos prematuros e precipitados, cujas consequências todos conseguem prever. Só quem entende o significado do sexo na vida e no bem-estar físico e mental das pessoas bem informadas e preparadas para escolhas conscientes é que consegue não ver o sexo como um problema a ser combatido, como uma experiência de vida a ser evitada. Tanto os Direitos Humanos (1948), quanto os Sexuais e os Reprodutivos (Ministério da Saúde, 2005) vêm para assegurar a todos o direito à informação científica e a autonomia moral e intelectual na vida como um todo, incluindo a sexual e a reprodutiva. Encerramos parafraseando Martinho da Vila e Zé Katimba que, em sua música “Café com Leite” (1997), comparam a relação sexual a essa mistura e dizem que ela é “Coisa de Deus”.


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