O Aborto e a Educação Sexual
Folha de Londrina, Espaço Aberto - 10 de Julho de 2013

A educação sexual foi apontada, na matéria de 09 de junho (Fim da polêmica sobre o aborto), como sendo a alternativa eficaz para se por fim ao problema do aborto. De fato, ela pode contribuir, significativamente, para reduzir o número de gravidezes não planejadas. Contudo, para alcançarmos um nível satisfatório de educação sexual, precisaríamos do envolvimento real dos Órgãos Municipais e Estaduais de Educação e das Universidades, com investimentos em formação inicial e continuada dos educadores. Além disso, seria imprescindível oferecer ao educador assessoria de profissionais especializados. Trabalho, há mais de vinte anos, com a formação de educadores sexuais, na Universidade, e posso afirmar, com tristeza e convicção: o Brasil está longe, muito longe, de um quadro satisfatório nesta área. 

Portanto, considero utópico creditar à educação sexual o potencial de modificar a realidade de abortos clandestinos, pois, ainda que tivéssemos uma situação idealmente positiva em relação à educação sexual, isso, por si só, não se apresentaria como uma solução para a questão. E por que não? Porque, segundo estudos feitos pela Organização Mundial de Saúde (OMS), todos os métodos contraceptivos apresentam falhas, inclusive, a laqueadura e a vasectomia. Além disso, o índice de estupros é altíssimo e há fatores de ordem inconsciente que levam uma mulher a engravidar sem planejar.

Em todos os tempos, a mulher tem sofrido não só com o cerceamento de sua autonomia como também com penalizações e culpabilizações de toda ordem que recaem sobre ela. Lembro-me de um caso que me foi relatado em uma palestra que ministrei: uma estudante de Pedagogia contou que era a quarta filha de uma família e que, quando tinha  5 anos, sua mãe engravidou e submeteu-se a um aborto, vindo a falecer.  Os boatos que surgiram, na época, sobre tal fato, imagino que diziam mais ou menos assim: "Viu só?! Pecou e foi castigada!". Mas outra leitura pode ser feita da situação: "Se essa mãe vivesse em um país em que o aborto fosse um direito e pudesse ser realizado em condições de segurança, não teria deixado órfãos seus 4 filhos!"

A IV Conferência Mundial da Mulher, em Beijing, na China, em 1995, recomendou "a todos os países a revisão das leis punitivas em relação à realização de abortos ilegais" e reconheceu "o  aborto como uma questão de saúde pública”, pois este  é feito clandestinamente, o que gera mortes ou sequelas  físicas e mentais para a mulher. No Brasil, que foi signatário deste compromisso, a estimativa é que aconteçam cerca de 1 milhão de abortos clandestinos por ano, e as mulheres pobres são as mais prejudicadas, pois  quem tem dinheiro paga mais e corre menos risco. A OMS também recomenda aos países que autorizem a interrupção da gravidez em condições de segurança e que preservem a saúde física e psíquica da mulher. Nas regiões onde o aborto é permitido não se constatou aumento em seu índice.

O presidente do Uruguai, em outubro do ano passado, ao descriminalizar o aborto em seu país, afirmou: "É mais inteligente não proibir!” A presidente Dhilma está se acovardando diante deste assunto, pois sabemos que a postura dela seria em prol da autonomia da mulher. Prefere calar-se para não perder a popularidade. É uma omissão que ficará na  história da única presidente mulher que o país já teve.

 Penso que se o aborto for descriminalizado e equipes de profissionais de apoio forem capacitadas, muitas mulheres que optariam por abortar talvez não o façam, pois passarão a ter com quem dividir seu desespero. O tema aborto precisa, sim, ser debatido, ser compreendido, pois é um sério problema social para o qual não podemos fechar os olhos.


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